domingo, 31 de janeiro de 2010

Quero-quero e Barbosa Lessa


A Lu, em comentário na postagem anterior, trouxe a letra de uma música de Barbosa Lessa. Isso me levou a aprofundar o assunto e postar novamente sobre o mesmo tema.




QUERO-QUERO

Neusa M. B. Secchi.

Pela Lei n 7.418, de 1º de dezembro de 1980, o Estado do Rio Grande do Sul instituiu, como sua Ave-símbolo, o Quero-Quero, cujo nome científico é Venellus chilensis. Popularmente, também é conhecido como “térem-terém”, ou “téu-téu”.

O quero-quero tem voz extremamente estridente. Adota, às vezes, a tática de pescar, semelhante a certas garças, espantando larvas de insetos e peixinhos ocultos na lama, mexendo rapidamente um pé. É comum em todo o folclore brasileiro, de Norte a Sul, participar de cantos, estórias, tradições. Também é cantado e citado em poemas regionais do Rio Grande do Sul.

Rui Barbosa, em 1914, incluiu-o num discurso célebre pela vivacidade maliciosa e originalidade da sátira. Evocou a “figura imperatória do quero-quero, o chantecler dos potreiros. Este pássaro curioso, a que a natureza concedeu o penacho da garça real, o vôo do corvo e a laringe do gato, tem o dom de encher os descampados e sangas das macegas e canhadas com o grito estrídulo, rechinante, profundo, onde o gaúcho descobriu a fidelíssima onomatopéia que o batiza”.

Ave tradicional dos campos gaúchos, com o chamativo de preto, branco e cinzento na plumagem, o penacho na cabeça com cauda branca e os olhos vermelhos. O quero-quero é facilmente encontrado em todas as estações do ano, em qualquer parte do Estado onde existe um pedaço pequeno de seu habitat preferido, o campo.

Vive em casais e a fêmea normalmente põe de três a quatro ovos em campo aberto. O casal defende rigorosamente seu território de criação, com vôos rasantes, atacando os intrusos. Possui um esporão pontudo, ósseo, no encontro da asa e que pode ser usado para a sua defesa.

Vê-lo cruzando no céu ou ouvi-lo cantando ao longe é como receber boas-vindas por estar no RS. Chamado de “Sentinela dos Pampas”, está sempre em alerta, noite e dia, dando sinais a grande distância de quem se aproxima.
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Se um grito de ferro açoite
Quero-quero vai voando
Estruge no ar austero,
E os esporões vai batendo;
Não tremas, é o quero-quero
Quero-quero quando grita,
Que vem dar-te a boa noite
Alguma coisa esta vendo.

Simões Lopes Neto (Cancioneiro Guasca)
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LENDA DO QUERO-QUERO

Quando a Sagrada Família fugia para o Egito, com medo das espadas dos soldados do Rei Herodes, muitas vezes precisou se esconder no campo, quando os perseguidores chegavam perto.
Numa dessas vezes, Nossa Senhora, escondendo, o Divino Piá, pediu a todos os bichos que fizessem silêncio, que não cantassem, porque os soldados do rei podiam ouvir e vir da fé.
Todos obedecem prontamente, mas o quero-quero, não: queria porque queria cantar. E dizia: Quero! Quero! Quero!E tanto disse que foi amaldiçoado por Nossa Senhora: ficou querendo, até hoje.

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Quero-Quero

Valsa campeira
Letra e música de L. C. Barbosa Lessa

Quero-quero! Quero-quero!
Quero-quero gritou lá em cima,
Quero-quero quando grita
É porque alguém se aproxima.

Quer-quero no meio da noite
Gritou porque viu alguém se aproximar.
Eu, também, na noite da vida,
Enxerguei essa luz que vem de teu olhar.
Mas agora, gauchinha,
Eu grito com todo fervor:
Quero-quero! Quero-quero!
Quero-quero o teu amor!

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LEI Nº 7.418, DE 1º DE DEZEMBRO DE 1980.
Institui como Ave-Símbolo do Rio Grande do Sul o Quero-Quero, Belonopterus Cayennensis.
JOSÉ AUGUSTO AMARAL DE SOUZA, Governador do Estado do Rio Grande do Sul.
Faço saber, em cumprimento ao disposto no art. 66, item IV, da Constituição do Estado, que a Assembléia Legislativa decretou e eu sanciono e promulgo a Lei seguinte:
Art. 1º - É consagrada como ave-símbolo do Estado do Rio Grande do Sul a ave "Belonopterus Cayennesis", predominante nos campos gaúchos e popularmente conhecida como "Quero-Quero".
Art. 2º - Revogam-se as disposições em contrário.
Art. 3º - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
PALÁCIO PIRATINI, em Porto Alegre, 1º de dezembro de 1980

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Luiz Carlos Barbosa Lessa

Nasceu em 13 de dezembro de 1929, numa chácara nas imediações da histórica vila de Piratini (capital farroupilha), RS.
Devido à dificuldade para cursar uma escola regular, teve de aprender as primeiras letras e quatro operações com sua própria mãe, a qual, ao se improvisar de professora, também lhe ensinou teoria musical, um pouco de piano e, inclusive, uma novidade na época chamada datilografia.

Indo cursar o ginásio na cidade de Pelotas (Ginásio Gonzaga), aos doze anos fundou um jornal escolar ("O Gonzagueano"), em que publicou seus primeiros contos regionais ou de fundo histórico. E também fundou o conjunto musical significativamente denominado "Os Minuanos" (uma das tribos indígenas no velho Rio Grande do Sul), que pretendia se especializar em música regional gaúcha mas que, por inexistência de repertório àquela época, teve de se conformar com o gênero sertanejo e um tanto de música urbana brasileira.

Para cursar o 2o grau colegial, transferiu-se para Porto Alegre, ingressando no Colégio Júlio de Castilhos. Aos dezesseis anos de idade já colaborava para uma das principais revistas brasileiras de cultura ("Província de São Pedro") e obteve seu primeiro emprego como revisor e repórter da "Revista do Globo".

No ano seguinte participou da primeira Ronda Crioula/Semana Farroupilha e, munido de um caderno de aula para coletar assinaturas de eventuais jovens que se interessassem pelo assunto, tomou a iniciativa para a fundação do primeiro Centro de Tradições Gaúchas (CTG), o "35".

Nesta agremiação ele retomou seu interesse pela música regional e, na falta de repertório, foi criando suas primeiras canções, tais como a toada "Negrinho do Pastoreio" - hoje um clássico da música regional gaúcha.

Bacharel pela Faculdade de Direito de Porto Alegre (UFRGS), 1952.

Formando com seu amigo Paixão Côrtes uma abnegada dupla de pesquisadores, de 1950 a 1952, realizou o levantamento de resquícios de danças regionais e produziu a recriação de danças tradicionalistas. Resultado dessa pesquisa da dupla foi o livro didático "Manual de Danças Gaúchas" e o disco long-play (o terceiro LP produzido no Brasil) "Danças Gaúchas", na voz da cantora paulista Inezita Barroso.

Incentivou a realização do Primeiro Congresso Tradicionalista do Rio Grande do Sul, levado a efeito na cidade de Santa Maria, em 1954, quando apresentou e viu aprovada sua tese de base socióloga "O Sentido e o Valor do Tradicionalismo", definidora dos objetivos desse movimentos.

Em 1956 montou um grupo teatral para apresentação de sua comédia musical "Não te assusta, Zacaria!", e saiu divulgando as danças e os costumes gauchescos por todas as regiões do Rio Grande do Sul, colhendo aplausos também nas cidades de Curitiba e São Paulo.

Residiu na capital paulista até 1954, envolvido com produção de rádio, televisão, teatro e cinema, detendo-se finalmente na área de propaganda e relações públicas.
Chefe de grupo-de-criação da Jr. Walter Thompson Publicidade e chefe de relações-públicas do Banco Crefisul de Investimentos.

Voltou a Porto Alegre em 1974, já como especialista em Comunicação Social, tendo trabalhado na Mercur Publicidade e Companhia Riograndense de Saneamento, CORSAN. Aposentou-se como jornalista em 1987.

Entrementes, na administração de Amaral de Souza, foi Secretário Estadual da Cultura, tendo então idealizado para Porto Alegre um centro oficial de cultura acadêmica, que veio a pré-inaugurar em março de 1983: a Casa de Cultura Mário Quintana.

Mantinha pequena reserva ecológica no município de Camaquã, onde residia com sua esposa Nilza, dedicada à produção artesanal de erva-mate e plantas medicinais.
Filhos: Guilherme, analista de sistemas, residente em Porto Alegre e Valéria, casada com norte-americano e residente no estado de New Jersey, USA.

Teve destacado nome na música popular e na literatura. Dentre suas músicas, sempre de cunho gauchesco, destacam-se "Negrinho do Pastoreio", "Quero-Quero", "Balseiros do Rio Uruguai", Levanta, Gaúcho!", "Despedida", bem como as danças tradicionalistas em parceria com Paixão Côrtes.

E numa bibliografia de cerca de cinqüenta títulos, destacam-se os romances "República das Carretas" e "Os Guaxos" (prêmio 1959 da Academia Brasileira de Letras), os contos e crônicas de "Rodeio dos Ventos", o ensaio indigenista "Era de Aré", a tese pioneira "O sentido e o Valor do Tradicionalismo", o ensaio "Nativismo, um fenômeno social gaúcho", "Mão Gaúcha, introdução ao artesanato sul-rio-grandense", o álbum em quadrinhos "O Continente do Rio Grande" (com desenhos de FLávio Colin) e os didáticos "Problemas brasileiros, uma perspectiva histórica"", "Rio Grande do Sul, prazer em conhecê-lo", e "Primeiras Noções de Teatro". Também os dois volumes do Almanaque do Gaúcho.

Foi Conselheiro Honorário do MTG - Movimento Tradicionalista Brasileiro.

Faleceu em onze de março de 2002.


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Fonte:
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Próxima semana, o retorno de Krika. Aguardem.
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3 comentários:

Lu disse...

Oigalê! Mas que pesquisa bagual, vivente!

"Fazer-se de quero-quero- Para despistar, o quero-quero afasta-se do ninho e dos filhotes, nos momentos de perigo. Donde se coloca grita insistemente iludindo a atenção do inimigo sobre ele. Quem disfarça ou ludibria faz como o quero-quero." (Sylvio da Cunha Echenique, Bruaca, RJ, Ed. Souza, 1954, p. 41).

"Fui mui franco, porque não sou como quero-quero que canta pra um lado e tem ninho pra outro."
(Érico Verissimo, O Tempo e o vento, P.A., Globo, 1950, 1975, p. 142).

ó... hoje nem vô canta..Mas posso dizer uns versinhos? Pera, vou subir no banquinho...rss

De Lobo da Costa...

" Se um grito de ferro açoite
Estruge no ar austero,
Não tremas: é o quero-quero
Que vem te dar boa noite."

Otro, posso?...já que tô trepada no banquinho...(hahahaha)

Teru-tero! dice el canto
de éspájaro gritón,
que da su alerta en el pago
o avisa de una traición."
(Blanca Bender Carpena de Menezes, Teru tero)


Um abraço, do tamanho do Rio Grande!

Quasímodo disse...

Lu; o coreto estará sempre armado para ti, nem precisas de banquinho. Cante à vontade, até mesmo em castelhano...

A culpada por esta postagem és tu... Cantastes Barbosa Lessa na anterior...

Grande abraço.

Anônimo disse...

É emocionante entrar na torre. Aqui dentro tudo é vivo, a luz vem de todos os lados, tem um calor que aconchega e parece que todos falam sorrindo, que sempre há um abraço apertado pra quem vem de fora. A ave da qual falam é linda, mas sempre me deu medo e agora é de todo o meu respeito, sempre as vi de longe, voando baixo ouvigiando e gritando com todo o receio de quem grita que o chão onde pisa tem dono. É a ave que retrata muito bem quem somos, e somos gaúchos. A ela, como a nós, o que é nosso ninguém tira sem uma peleia. É tanta minha adoração por essa ave que gravei uma no braço esquerdo, de assas abertas, peito estufado, cabeça de lado, portando uma boleadeira nas patas. Há mais um espaço reservado para elas no braço direito. Na nossa empresa sempre nos fazem compania pelo menos um casal. Mas tem dia que nem as máquinas e os caminhões calam a algazarra delas. Sempre que vejo, recolho alguma pena no chão. Queira um dia deitar entre elas.
Até mais pessoal.
Quasímodo, obrigado pelas palavras.
PC.

 
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